terça-feira, 29 de novembro de 2011

O Inesperado das partilhas

(De volta aos contos)

Enquanto todos os seus amigos, faziam a sua escolha via família, ela sempre seguiu a carreira… em nenhum destes anos pós faculdade sentiu algum tipo de remorso pelas opções que fez. Aliás ao contrário do que muitos pensavam todas eram ponderadas a exaustão, desde do primeiro emprego ainda enquanto estudava até ter declinado um convite sedutor para ir chefiar a empresa mãe em Londres.
Agora altas horas da noite, sozinha no seu luxuoso escritório no último andar, nas torres mais In de Lisboa ponderava enquanto olhava a noite se de facto teria seguido o melhor caminho.
Sorriu enquanto bebericou o seu chá verde com tangerina, era oficial, do grupo era a solteirona, pelo menos a partir de sábado que vinha… também a Sara (a croma do grupo) ia dar o nó.
Estava contente por ela, aliás esse sempre tinha sido o sonho dela, mas infelizmente os últimos encontros da malta envolvia sempre conversas sobre chá de fraldas, coco verde ou primeira dentição, quando se dava ao luxo de uma noite entre amigas ela era sempre a sua salvação.
Olhou para a luz néon do seu PC, e resignou-se ao facto que não iria conseguir avançar mais com o relatório que estava a trabalhar… nunca insistia consigo mesma, conhecia-se demasiado bem para saber que o que conseguiria fazer a partir de agora teria de ser refeito amanha.
Antes de sair e maníaca pela ordem como era, ainda perdeu meia hora a colocar ordem na sua secretária… saiu já passava da meia-noite, passou pelo segurança no ritual já absorvido por anos de horas extras:
- Até amanha Sr. Abílio, tenha uma noite tranquila e não abuse do café.
- Até amanhã menina, trabalha demais… devia estar em casa abraçada a um homem que a mereça com os rebentos a dormir entre o vosso colo. Não entendo uma moça tão bonita, tão simpatia e instruída ainda só.
- É o mau feitio Sr. Abílio… ninguém me atura por muito tempo. Sorrindo e piscando o olho a este homem sempre tão atencioso.
Todas as noites sempre igual… já lá iam 12 anos… sabia que amanhã teria na sua secretária uma rosa branca e um bilhete de bons dias.
Saiu para a noite cansada com a cabeça a mil… nunca tinha tido dúvidas sobre o seu caminho a seguir, porque é que teimavam em aparecer agora.
Ponderando bem quanto mais sucesso tinha profissionalmente, mas fracassos acumulava na sua vida pessoal… uns tentavam doma-la… outros sentiam-se intimidados. Havia também quem quisesse mostrar-se tranquilo e compreensivo… eventualmente ou se cansava ela ou se cansavam eles… na maior parte cansava-se ela com as cobranças… as obrigações o imposto que nada tinha a ver com a relação mas sim com o que se esperava que acontecesse-se numa relação.
E quanto aos amigos coloridos? Nunca tinha tido a mínima vocação para esse tipo de entrega.
Sentia falta do aconchego de um abraço… não era de ferro que raio… mas com a lufa-lufa do dia a noite calma que a abraçava quando chegava a casa não era um refugio… era um amante.
Deu por si em frente a única pastelaria que estava aberta aquela hora da noite… o cheiro das tartes de limão acabadas de fazer deixaram-na faminta.
Entrou sem pensar:
- Quero uma tarte de limão e dois sumos de laranja para levar por favor.
Voltou ao escritório e sorrindo como já algum tempo não o fazia entrou…
- Sr. Abílio quer companhia para a noite? Tenho tarte de limão e sumo de laranja… no mínimo passamos a noite na conversa no máximo temos uma crise de fígado que me diz?
- De volta menina? Não se mace e vá descansar.
- Há quanto tempo nos conhecemos? 12 anos? È hora de retribuir a rosa…
- Então e o mau feitio?
- Não conte a ninguém mas dei-lhe folga esta noite…
- Ai menina vivemos segundo as escolhas que fazemos não é? Vá dê-me lá uma fatia dessa tarte… sabia que a minha senhora fazia umas deliciosas? Venha cá que eu conto-lhe como se pode ser feliz vivendo uma vida que se escolhe… não uma que nos impõem.
Pensa que eu não sei que anda com dúvidas sobre as suas?
Quer saber um segredo? As escolhas têm uma coisas boa… podem sempre levarmo-nos a caminhos que nem suspeitamos…
Sorriu entregando a fatia de tarte e descalçando os sapatos sentou-se para aquela que seria a primeira noite de muitas de partilhas inesperadas.

12 comentários:

Unknown disse...

Não percebi. Então o senhor Abílio não é casado? Não é um cota?

Teresa Santos disse...

Utena,

Escolhas que parecem fáceis, mas...?
E as consequências? E os vazios?
E a necessidade absoluta de um ombro?
Os "Srs. Abílios", adoçam momentos, não preenchem vidas.

E os contos continuam, suponho.

Beijinho grande.

Paula disse...

Fire,

O Sr. Abílio é apenas aqueles "anjos" que nos mostram as vezes que as escolhas acontecem por um motivo e nos mostram que nem sempre a felicidade está no que é considerado ideal em todo o lado

Paula disse...

Teresa,

Escolhas sem ser egoístas de quem sabe muitas vezes não puder dar de si tudo para que a relação não se torne numa ralação...
Os contos fazem parte de mim... lá vão saindo.

Beijinho minha querida

Unknown disse...

Não me respondeste à pergunta, Utena. Mas ele por acaso até pode ser interpretado como sendo um viúvo e, assim, já reduz uma certa carga dramática. :P

Paula disse...

Ghost Rider,

O bom dos contos é puderem ser interpretados da maneira que queremos.
Mas o Sr. Abílio já é cota sim e viúvo.

CF disse...

Minha querida
brilhante como sempre e com um mote final de matar...:)

as escolhas têm mesmo esse poder...irmos a sítios nunca antes navegados!!!
É necessário ousar :))
Oxalá a protagonista ousasse sair do emprego mais cedo e pensar mais em si, como pessoa e não só como boa profissional!!!:)
bjs grandes

Álvaro Lins disse...

Tenho para mim que o problema não está nas escolhas! Reside na forma e na intenção com que as fazemos:)!
Parabéns pelo texto. Excelente, mas tu sabes:).
Bjo

Paula disse...

CF,

Sabes que por vezes a escolha é mesmo essa... o nível profissional acima de tudo.
Isso não faz de nós aliens... apenas mulheres diferentes.

Beijinhos

Paula disse...

Álvaro,

Sempre com uma palavra que define as coisas de forma perfeita.

Beijinhos

Me 2.0 disse...

Arrepiei-me.... Conheço tão bem esta problematica!!

Parabens pelo texto amiga!!

LOVE IT !

Paula disse...

Carrie,

Podíamos ser nós certo...
As vezes vem-me assim estes repentes

Beijo grande